♫ Visão Alex

♫ De início não consigo acreditar no que está diante de meus olhos. Foi como se eu tivesse levado uma facada. O sinal bate como se fosse um gongo iniciando uma luta.

Pego meu celular, desligo a tela e o coloco dentro da mochila. Will entra na sala como se estivesse um pouco perturbado, mas não fala nada. Uma lágrima ameaça escorrer. Mas não lhe dou chance de me fazer pagar mico. Fico virada para frente o resto da aula.

☆ ♫ ☆

♫ Não falei nada a ninguém. Nem para minha mãe, nem tia, nem Charlie, nem Mary. Chego em casa e vou diretamente para meu quarto. Quando entro, fecho a porta e deito de bruços na cama, colocando o travesseiro sobre a cabeça.

♫ Algumas lágrimas molham a colcha da cama silenciosamente. Eu não sei o que me deu de confiar em um garoto popular que disse que gostava de mim. Claro que não gostava. Por que gostaria? Eu sou difícil, carrancuda. Ele poderia pegar qualquer uma quando quisesse, facilmente.

♫ Alguém dá batidinhas na porta de meu quarto e eu tento limpar a lágrimas a tempo, mas não é possível. Minha tia abre a porta do quarto e a adentra. Vendo minha situação de choro, se assusta.

♫ Não preciso falar nada para que ela me abrace forte. Queria ficar brava com ela, pois estava escondendo coisas de nós... Mas não conseguia, eu nunca consegui.

- O que aconteceu? - pergunta ela em voz serena.
- Will me traiu com outra garota hoje. Staicy me mostrou uma foto.
-... Será que elas não fizeram alguma armação? Will nunca faria isso com você.
- Talvez tenha feito e eu não queria acreditar...
- Você não deveria ficar dentro de casa enfurnada desse jeito. Deveria sair. Você não comentou sobre uma festa de fim de trimestre...?
- Sim, mas eu não vou lá para o ver ficar com outra garota.
- Pare de falar besteira! Vai sim, para mostrar que é forte o suficiente para superar em menos de um dia. Na realidade, vim para lhe contar uma coisa.
- Que coisa?
- Você e sua mãe andam muito desconfiadas quanto a mim. Acham que eu estou saindo com alguém certo? Pois bem.

♫ Ela faz uma pausa para organizar as palavras que seriam ditas.

- Eu estou saindo com o pai da Mary.
- Disso eu já desconfiava.
- Mas não é como você pensa! Somos amigos e colegas de hospital a anos. Quando descobrimos que as duas eram tão próximas, tivemos a ideia de fazer uma viajem de fim de ano, todo mundo junto. Quando vi que você e sua mãe estavam pensando coisas totalmente fora de órbita, percebi que era de contar a surpresa.
- Ah... - fico totalmente sem jeito.

♫ Minha tia ri e diz:

- Agora alguém tem que ir a uma festa.
- Infelizmente. - sorrio para minha tia.

☆ ♫ ☆

♫ Pois bem. Eu não queria mesmo ir àquela festa. Por isso minha tia escolheu minha roupa e simplesmente me obrigou a botá-la. Eu, como uma criança obediente que estava na bad – triste e deprimida -, coloquei-a. Eram mais ou menos 19h00min horas.

♫ Quando percebi a roupa que estava colocando, tive que sorrir: vestido vermelho sangue, meus coturnos de cano alto e uma jaquetinha de couro - a mesma que usei no encontro com... Ninguém, não importa.

♫ Tia Carmen me leva até o endereço que me passaram pelo Whatsapp de onde seria a festa e quando chegamos, ela diz:

- Não preciso lembrá-la do que é certo ou errado, então boa sorte. Mostre a ele o que perdeu!
- Obrigada tia.
- De nada, agora vai!

♫ Desço do carro dando risada e chamo a atenção de alguns garotos que estavam na entrada da casa. Ganhei até um assovio vindo de um cara do 2º ano. Ao adentrar a porta, vejo que muitos já estão tomando sei lá o que em copos descartáveis. Eu nem sabia que aquilo seria apenas o início de uma noite muito agitada.

♫ Visão Will

♫ Carol e Staicy agora estragaram de vez meu relacionamento com a Alex. Muitos devem estar se perguntando o porquê de eu não ir lá explicar a ela o que realmente aconteceu. É que... Eu quero que ela me odeie, infelizmente. Sei que quando chegar a hora da minha partida será muito mais difícil para ela se estiver de bem comigo do que de mal.

♫ Eram umas 19 e meia quando Charlie me chamou no whatsapp perguntando se eu não ia ir à festa de fim de trimestre. Obviamente respondi que não. Não sei por que, mas depois que as coisas se definiram entre eu e a Alex e entre ele e a Mary, nos tornamos até que bons amigos.

♫ Justo por que tínhamos nos tornado amigos, ele deu um jeito de me convencer a ir. Ele não sabia o que havia acontecido, e usou o exemplo de que Alex iria. Não sei que impulso me deu na hora, mas eu decidi ir. Até para ver como ela estava. Até para ver se eu já havia sido esquecido.

♫ Para ver se eu estava fazendo a coisa certa.

♫ Visão Will

♫ Não sei. Lá pelas tantas até que comecei a me divertir. Charlie e Mary estavam lá comigo e me distraíram. Eles perceberam que havia algo de errado comigo, mas não tiveram muita insistência em descobrir. Mary ficou super-animada com a ideia de viajem de férias e também riu muito comigo das nossas conclusões precipitadas.

♫ Estávamos os três sentados em um sofá em formato de “L” na sala enquanto outros estavam no chão, jogando videogame na TV de 50 polegadas. Eu tive o cuidado de checar se o conteúdo do copo em que estava bebendo era refrigerante e não cerveja, obviamente.

♫ Eu havia me esquecido da realidade, até que Will adentra a porta em todo seu charme de garoto popular. Parecia estar me procurando. Antes que me achasse, dei a desculpa de que iria ao banheiro para Charlie e Mary e me dirijo para os fundos da casa.

♫ Havia menos pessoas lá. Sento-me a uma mesinha a beira da piscina e sinto a brisa fria tinha começado a se instalar na noite. Sinto ser observada e encontro Daniel vindo em minha direção. Ele senta-se na cadeira a minha frente e sorri. Dou-lhe um sorriso triste e observo a água.

- Tudo bem? – ele pergunta parecendo preocupado com meu bem estar.
- Tudo, só precisava de um ar.
- Hum... – Diz ele um pouco desconfiado.

♫ Ficamos um tempo sem dizer nada, e de repente ele pergunta:

- Gosta realmente do Will?
- Pergunta um pouco indiscreta, não acha? – digo rindo.
- É que... Ele não parece ser uma pessoa... Vamos se dizer assim... “Fiel” ao que faz bem a ele. – responde ele rindo de inicio e depois tomando um tom totalmente sério.
- Sua irmã contou a você, não foi?
- Exatamente.
- Não falei com ele sobre isso, nem vou falar, é um assunto que não tem explicação. Terminamos. Eu terminei com ele. Ele só não sabe ainda... Acho até que a culpada disso sou eu por ter dado confiança de mais a quem não merece.

♫ Após um momento de silêncio em que nós dois parecemos refletir, ele pergunta:

- Ainda terá confiará em outros com o tempo?
- Espero que sim, por que no momento, eu estou bem desconfiada com tudo. Por que a pergunta?
- Por que acho que quero ser alguém a ganhar sua confiança.

♫ Estávamos muito próximos. Aquilo me deixava inquieta. Imaginem meus sentimentos quando ele começou a se aproximar mais ainda. Eu o entendia. Ele tinha a esperança de que pudéssemos ter uma chance. Mas eu... Não estava preparada para aquilo.

♫ Ainda tinha esperança de que Will tivesse algum motivo racional se não o qual eu achava ser o dele. Afasto-o de forma gentil dando um basta em suas crescentes esperanças. Mas já era tarde. Will já estava puxando-o para longe de mim.

- O que te dá o direito de achar que pode dar encima da minha namorada, novato? – pergunta Will furioso.
- Talvez o fato dela não te querer mais. – desafia Daniel novamente com equilíbrio depois do puxão de Will.
- ACALMEM-SE OS DOIS. – Levanto e me ponho entre eles. – Brigar não vai adiantar nada.
- Vai se esse cara te deixar em paz. – diz Will indo na direção de Daniel.

♫ Coloco-me na frente dele e percebo que algumas pessoas tinham vindo ver o que estava acontecendo.

- Eu deixar ela em paz? Você que a traiu, não eu. – diz Daniel.
- Cala a sua boca antes que eu faça isso. – Will ameaça.

♫ Mais pessoas vêm assistir, inclusive Staicy e Carol, que trocavam sorrisos por terem me colocado naquela situação. Respiro fundo e digo em tom de autoridade:

- Não tem nada para ninguém ver aqui. Will deixe-me em paz, por que você não tem o direito de querer se achar o bonzão pra cima de todo mundo depois do que fez comigo. Daniel, melhor não querer mais falar comigo. Eu vou embora.

♫ Saio dali com a cabeça erguida e passo por entre a multidão que tinha se formado na porta que dava para a sala de estar. Charlie e Mary ainda estavam na sala, mas de pé, tentando saber o que aconteceu. Quando me veem, perguntam o que houve:

- Nem eu sei mais. – respondo já me dirigindo para a saída.

♫ Passo pela porta da frente sem olhar para trás. Minha casa era a várias quadras dali, mas eu não iria esperar minha tia vir me buscar. Quando eu já estava a uns 10 metros da casa, Will aparece correndo atrás de mim. Finjo não o escutar me chamando, mas ele me alcança e me faz parar.

- Eu nunca te expliquei o que aconteceu naquele dia. Deixe-me explicar.
- Você também já perdeu esse direito. – continuo andando.
- Mas eu vou explicar igual, mesmo que você não queria ouvir.

♫ Eu paro e o olho com um olhar furioso. Ele entende isso como uma chance.

- Naquele intervalo, eu recebi uma mensagem do seu celular dizendo para te encontrar no armário do zelador. Eu fui e encontrei a Carol. Quando eu comecei a entender o que estava acontecendo, ela me beijou e a Staicy bateu a foto.
- E por que você não veio me dizer isso antes? – pergunto ainda não acreditando no que ele havia dito, apesar de fazer sentido.
- Por que eu achava que era melhor para você me odiar.
- POR QUE, WILL? Eu quero motivos!
- Por que meu irmão convenceu minha mãe a nos mudarmos no fim do ano para morarmos com ele.
- O que? – quase me afogo.
- Eu não queria que você soubesse antes para que não ficasse assim até o fim do ano. E ainda há uma chance de que eu convença minha mãe a ficarmos.
- Meu Deus... Eu nunca iria imaginar que...
- Eu sei. Eu deveria ter te contado. Isso tudo não teria acontecido. Desculpa Alex...

♫ Em um impulso o abraço depois de juntar todas as peças do quebra-cabeça.

- Realmente acredita em mim? – pergunta ele surpreso.
- Apesar de ter te odiado... Eu acredito.
- Acho melhor te levar para casa e me explicar com sua família. Você deve ter contado e sua mãe e sua tia devem estar cuspindo fogo comigo.
- Acredite, estão.

♫ Rimos e começamos a andar.

♫ Eu e Will chegamos a minha casa juntos e de mãos dadas. Minha tia e minha mãe não pareceram gostar muito, por que fizeram aquela cara de “O que você está fazendo?” pra mim. Minha tia obviamente já devia ter contado para minha mãe o que havia acontecido. Will, notando que elas iriam matar ele se não apresentasse satisfações, começou a falar.

♫ Explicou como todas as peças daquela história se encaixavam e como tudo aconteceu de modo que o plano de Staicy e Carol desse certo. As duas pareciam pensar na história com cuidado, e até mesmo tia Carmen, que havia achado que Will era inocente de início, parecia desconfiada.

♫ Sabendo que apenas palavras não iam comprovar que a história era verdadeira, ele também mostra a mensagem que recebeu na hora exata do intervalo, vinda do meu celular, e eu a foto tirada. Tudo se encaixava. E por que, apesar de tudo, eu ainda me sentia um tanto duvidosa? Eu estava nesse ponto de insegurança?

♫ Olhando minha mãe que olhava para nós dois, pensei que talvez ela não fosse se convencer.

♫ Então sua expressão se suaviza, e ela fala:

- Mas o que você vai fazer Will? Acha que consegue convencer sua mãe a ficar?
- Eu tenho que conseguir. Ela não pode me obrigar a mudar de país e deixar toda a minha vida para trás. Achar a Alex.
- Bem, torçamos. Pedimos desculpas por ter quase te atacado. É que a história era bem diferente minutos atrás.
- Capaz. Até mesmo eu teria me atacado por ser tão idiota.

♫ Acho que eu não devia me preocupar.

☆ ♫ ☆

♫ Will havia ido embora lá pela meia noite. Eu estava tão cansada que nem demorei muito para pegar no sono. Mesmo dormindo, minha cabeça parecia não querer parar de pensar nos “e se”.

♫ Ao acordar com alguém fazendo carinho no meu cabelo, abro os olhos e encontro minha tia. Então ela diz:

- A noite longa, não é?
- Sim, com certeza...
- Que tal pedirmos um xis? Sua mãe teve que sair às pressas para resolver algumas coisas no trabalho e eu não estou com a mínima vontade de cozinhar.
- Topo. – digo sorrindo e já pensando no gosto do xis filé com bacon que eu adorava.

♫ Levanto e visto meu chambre. O clima andava mais frio nos últimos dias. Vou ao banheiro e lavo o rosto. Estava com umas belas olheiras.

♫ Desço para a sala e sento no sofá enquanto minha tia ligava para o restaurante. Após pedir a comida e passar o endereço, ela senta ao meu lado. Após me olhar por alguns momentos, comenta:

- Parece que você ainda está meio triste, Alex.
- É por que estou.
- Mas não está tudo resolvido?
- Não é isso... É que... E se ele tiver mesmo que ir embora?
- Você tem que ser positiva.
- Falar é fácil.
- Não é bem assim. Já passei por isso. O menino que eu gostava no nono ano teve que se mudar por que o pai era militar. Essas coisas acontecem... Vai ver não era pra ser. Mas eu sei que as coisas vão dar certo para vocês se forem para dar.
- É. Tem razão.
- Quem sabe saia hoje com seus amigos. Sua mãe não vai voltar tão cedo mesmo.
- Mas e você?
- Eu vou atualizar minhas séries pelo sábado inteiro, e não quero nenhuma pessimista por perto.

♫ Rio do jeito que minha tia fala aquilo.

♫ Há algum tempo eu não gostava muito dela. Parecia também que ela não gostava de mim. Mas agora percebo que eu não dava muitas chances para ela se aproximar. Por que eu fazia isso? Poxa, ela é uma das pessoas que eu mais confio e que eu mais sou próxima agora. Acho que nunca vou entender como eu era antes.

- O.K. Vou chamar Mary, Charlie e Will depois para tomarem um sorvete.
- Acho muito bom.

♫ Sorrio para ela.

♫ Visão Alex.

♫ Convido todos pelo nosso grupo do whatssap para irmos a uma cafeteria no centro da cidade, e em alguns poucos minutos, todos tinham confirmado e concordado que nos encontrássemos na praça para seguirmos até ela. Coloco uma roupa bem simples – regata branca e jeans – e prendo meu cabelo em um alto rabo de cavalo. Minha tia aprova e deixa que eu vá a pé.

♫ O dia está ensolarado e apenas algumas nuvens mancham o azul claro do céu. Um ventinho frio às vezes bate em meus braços despidos e em meu cabelo preso.

♫ Ao passar perto da pracinha, vejo várias crianças brincando em um balanço. O balanço no qual eu brincava com meu pai. Às vezes eu até acho que superei o fato dele ter partido, mas há momentos em que todas as lembranças vêm à tona. Fico um tempinho ali, parada, observando o movimento. Então sinto duas mãos pegarem em minha cintura por trás.

♫ Assusto-me até sentir seu perfume e por fim relaxar. Pergunto com um sorriso que ele não pode ver:

- Quem te deu permissão para ter tanta intimidade?
- Talvez você, talvez eu... Faz diferença? – Will ri e me abraça.

♫ Rio também e me viro, encontrando seus olhos azuis. Parece que todo aquele barraco dos dias anteriores nunca aconteceu. Ergo-me dando-lhe um beijo rápido nos lábios e pegando sua mão. Minha insegurança e barreiras desaparecem.

- Charlie e Mary já chegaram?
- Ainda não, eu acho. Não os enxerguei.
- Hum, vamos sentar e esperar então.

♫ Vamos até um banco e nos sentamos, e enquanto isso eu fico sentindo o cheiro de relva das árvores.

- Senti saudade disso. – diz ele.
- Do que? – pergunto distraída pelo barulho familiar do balanço.
- De nós. Apesar de terem sido poucos dias de... “separação” – ele faz uma pausa fazendo com que eu o olhe. – Foi algo horrível.
- É... Eu sei. Mas o que vamos fazer se você não conseguir ficar?
- Eu vou ficar. Meu irmão é de lua. Ele pode desistir da ideia do dia para a noite. E se não desistir, eu dou um jeito. Agora esquece esse assunto por que hoje é um dia pra relaxar.
- O.K. Mestre. – digo debochando.
- Hahaha, você vai ver. – diz ele com um olhar desafiador.

♫ Will começa a me fazer cócegas e eu morro de rir. Alguém faz sombra a nossa frente.

- Será que dá para casal parar e irmos logo ao café? – pergunta Mary rabugenta.
- Nossa! O que aconteceu? – pergunto olhando sua cara de irritação. Percebo que Charlie está com a feição séria.
- Nada! – respondem eles ao mesmo tempo.
- Então tá... – eu e Will nos olhando já sabendo mais ou menos o que tinha acontecido.

♫ Eles provavelmente tinham brigado.

♫ Visão Mary.

♫ Graças aos céus meu pai não estava em casa e não precisei recusar o convite da Alex de um encontro no café do centro. Deixo os cabelos soltos e coloco um vestido azul marinho bem simples. Combinei com Charlie para que ele me esperasse na esquina que se fôssemos juntos.

♫ Saio e chaveio a porta sorrindo. A vizinhança toda está fora, e que bom que eu também não vou ficar sozinha em casa em pleno sábado. Caminho sob a sombra de algumas árvores e enxergo Charlie na esquina onde marcamos... Mas quem é aquela ali?

♫ Visão Charlie.

♫ Saio de casa com minha jaqueta de couro e jeans esfolados. Não que eu quisesse parecer um badboy ou algo assim, mas queria chamar a atenção de Mary. Não sei por que ouvi os concelhos de Will sobre “conquista”, porém estou sem opções. Depois daquelas tentativas falhas de me aproximar, as coisas meio que ficaram... Normais. E apesar de eu e Mary ainda estarmos próximos, estávamos de certa forma... Afastados. Enfim, é complicado.

♫ Chego à esquina em que a encontraria e ela ainda não estava lá. Olho alguns carros passarem, até uma garota loira e com sorrisinho falso aparecer.

- Gostei da jaqueta. – ela continua sorrindo.
- Hum... Obrigado. – digo não querendo ser mal educado.
- Porém... Por que você não a tira? O dia está tão... Quente.

♫ Onde ela queria chegar afinal?

- Nunca se sabe quando vai esfriar. – respondo um pouco secamente.
- Para de se fazer de difícil.
- Eu tenho namorada. – e tinha mesmo. Ela apenas ainda não sabia que estávamos juntos.
- Ah tá. E cadê ela?
- Vindo para cá.

♫ E é quando eu vejo Mary nos olhando com fogo nos olhos. Maldita jaqueta...

♫ Visão Mary.

♫ Charlie me olha como quem não tinha feito nada e eu chego até a pensar em dar meia volta. Porém meu instinto de seguir em frente me leva até a QUERIDA LOIRA de shorts que estava a frente do meu... Do Charlie.

- Estou interrompendo algo ou você já pode se varrer daqui? – pergunto a ela, grossa.
- Ah, entendi. Ela é do tipo superprotetora. – diz a loira irônica.
- Na verdade só não suporto gente como você. – sorrio sem dentes olhando-a nos olhos.
- Pena que ele gosta. – ela aponta para Charlie.

♫ Ele ia falar alguma coisa. IA.

- Claro! Seu loiro tingido que dá pra ver de longe acusa que você é muito cotada. – digo revirando os olhos, mostrando impaciência.
- E você não pintou o cabelo de ruivo, certo? – ela diz cruzando os braços, abusando da ironia.
- Ao contrário de você, eu estou bem feliz de como sou.
- Chega Mary. Essa garota apareceu do nada e... – Charlie começa.
- Então peça para que ela te leve ao nada também. – o interrompo.

♫ Saio andando em direção ao centro com o sangue fervilhando no rosto e nas mãos. Charlie não pensa duas vezes antes de começar a me seguir:

- Eu juro que foi ela que veio me encher o saco. – diz ele já ao meu lado.
- Pois que bom, pode ficar lá se quiser já que nem se importou dela estar quase babando.
- Eu falei para ela que... – ele para de falar.
- Falou o que, Charlie? – instigo.
- Que tinha namorada. – diz ele relutante.
- Mas que bom! Quero conhecê-la um dia desses. – digo tentando manter o mesmo tom de voz para que não pareça que eu me importo com a declaração.

♫ Ele fica quieto. Será que estava com vergonha do que tinha dito? MALDIÇÃO!

♫ Visão Charlie.

♫ Obviamente Mary sabia de que “namorada” eu estava falando, mas parecia que se fazer de boba parecia a melhor opção para ela. Chegamos perto da praça e já enxergamos Alex e Will sentados a um banco. Pareciam felizes, bem ao contrário de nós. Aproximamo-nos e Mary diz a eles, grossa:

- Será que dá para casal parar e irmos logo ao café?
- Nossa! O que aconteceu? – Alex pergunta se assustando um pouco com o tom de Mary.
- Nada! – respondo ao mesmo tempo que Mary e ela respira fundo.
- Então tá... – concorda Alex já trocando um olhar com Will.

♫ Eles não eram bobos.

♫ Visão Alex.

♫ Como eu não queria irritar mais ainda Mary, sabendo que o faria se continuasse a instigar sobre o que aconteceu, sigo com eles em silêncio para a Cafeteria. Sentamo-nos em uma mesa ao lado de uma grande janela de vidro e eu fico ao lado de Will, enquanto Mary de Charlie, apesar dela não ter ficado muito feliz com o fato. O lugar estava bem cheio.

♫ Pedimos o que cada um queria e eu escolhi um Cappuccino com Chantilly. Will, como sempre, pede um milk-shake de chocolate. Fico olhando distraída para o lado de fora da janela, e percebo que o tempo estava começando a fechar. Ótimo.

♫ Sinto uma mão pegar a minha por baixo da toalha e sorrio, apertando-a levemente. Deito minha cabeça em seu ombro e lamento pelo casal perfeito ao outro lado da mesa não estar fazendo o mesmo. Será que eu deveria dar um empurrãozinho...? Sei que ela vai me odiar por isso por alguns segundos.

- Viu... Eu e o Will vamos dar uma voltinha na praça já que o pedido certamente vai demorar com tanta gente aqui. – digo já olhando para ele, que parece confuso de início, mas depois apenas assente.

♫ Levantamos e eu não dou chance para que Mary retruque. Então deixamos os dois ali, para resolver seja lá o que devia ser resolvido.

♫ Visão Mary.

♫ Tenho que admitir que deu uma certa raivinha da Alex por me obrigar a ficar sozinha com o Charlie, pois, afinal, ela nem sabia o que tinha acontecido!

♫ Quando ela e Will saem pela porta da frente e vão em direção à praça de mãos dadas, eu olho para baixo e começo a mexer em minhas unhas. Charlie se mantem quieto por apenas um momento, até começar a dizer uma coisa que eu não esperava ouvir:

- Sabe... Eu olho tantos casais por aí, e parece tão fácil. Por que não pode ser da mesma forma para a gente?
- Talvez por que não sejamos um casal. – sugiro, arrependo-me no momento seguinte.
- Não vai me obrigar a falar algumas verdades que você já sabe, não é? – ele diz, pegando meu queixo levemente, fazendo-me olhar em seus olhos.
- A verdade é que você pode viver a vida como quiser, sem eu me intrometer. – digo sem saber que palavras usar.
- Mary... Você sabe que eu não queria aquela garota por perto, e também que não estava lhe dando atenção. Mas enfim... Eu só tenho uma coisa a dizer: eu vou estar aqui quando você decidir o que quer ou não. Eu só quero vê-la com o sorriso que provavelmente estava quando saiu de casa.

♫ Fico surpreendida, sem entender mais nada do que estava acontecendo em volta. Por que eu tinha me irritado tanto com ele? Que droga, Mary! Você se deixou levar por aquela loira idiota, e nem pensou que o Charlie que você conhece não gosta daquele tipo de garota. Por que se gostasse, já estaria com a Staicy há séculos.

♫ Por um momento esqueço as minhas travas e medos e o abraço com força. Eu já nem sei mais o que fazer. Afasto-me um momento depois e olho-o nos olhos novamente. Ele estava dizendo o que eu pensava que estava? Ah...

♫ Nosso pedido chega e Alex e Will cruzam a porta no segundo seguinte. Ela atirava na minha cara apenas com o olhar o fato de eu estar sorrindo. Odeio esse olhar de “viu?” que ela faz, mas adoro muito mais.

♫ Visão Will.

♫ Alex ou era uma ótima amiga ou era péssima, já que deixou a amiga sozinha com seu “problema”. Voto ser ótima, por que Mary sempre disse que cada um resolve seus próprios problemas. E Alex sabia que eles só podiam se resolver se estivessem sozinhos.

♫ Damos as mãos e começamos a caminhar até a praça novamente. Sentamos em um banco e ela deita a cabeça em meu colo, parecendo confortável.

- Tenho certeza que agora eles vão parar de manha. E se eu voltar lá e ela não estiver REALMENTE BEM, eu juro que mato o Charlie, por que daí a coisa foi feia. – diz ela autoritária.
- E é por isso que eu gosto de você. – digo rindo.
- O que tem? Só os quero junto de uma vez! – diz ela impaciente parecendo não notar o elogio.
- Eu sei. Você está na torcida que nem ela estava por nós.
- É! Você também não era nada fácil! – ela diz rindo.
- Ei! As circunstâncias que eram complicadas! Eu era e ainda sou um babaca, mas pelo menos agora um babaca que você suporta.
- Tanto faz. – ela diz animada, esquecendo um pouco da amiga. – Velhos tempos.
- Não tão velhos assim. – corrijo de propósito.
- Quer parar de retrucar? – ela levanta a cabeça e senta.
- Vem me fazer parar. – sorrio irônico.

♫ Ela parece brava de início, mas depois me dá um beijo longo nos lábios. Separo-nos por um momento e pergunto fingindo não me importar com seu carinho:

- Será que nosso pedido já chegou?
- Tomara que você se afogue com ele. – diz ela levantando-se e me puxando junto.